quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Brasil, esquentai vossos pandeiros!


Imaginem depois de seis meses de Rio de Janeiro?

Sim! Finalmente acabou a insuportável overdose de notícias e disse-me-disse sobre o destino de Ronaldinho Gaúcho. Chegou ao fim o tour gastronômico de Assis pelas churrascarias brasileiras, Brasil, esquentai vossos pandeiros, iluminai os Estádios que o Ronaldinho Gaúcho veio sambar. E veio sambar na gávea.
A grande questão é: Há muito o que comemorar? O que se pode exaltar dessa contratação? Que lição essa enfadonha novela pode trazer ao futebol brasileiro?
Desde o início, Assis controlou as negociações como um grande leiloeiro vende suas antiguidades. Martelo na mão, ouvidos atentos as propostas de cada mão que levanta após os brados de "Quem dá mais? Quem dá mais". Felizmente, a paciência dos clubes brasileiros uma hora acaba (depois de muito vexame, mas acaba) e orgulho, embora escasso, ainda brilha após um torrente de humilhações. A negocição se pautou inteiramente nas normas (ou na falta delas) do mundo moderno. O dinheiro grita e seduz, a palavra se dissipa assim que sai da boca de nada serve e nada vale. Não existe apelo de torcida, demonstração de carinho ou afeto. Isso nada compra e não se deposita, o fator determinante é pura e simplesmente o dinheiro. Se mente, volta atrás, acerta e depois desmente... tudo por um punhado de dólares a mais. A retirada de Grêmio e Palmeiras desse circo mostra que ainda há resquícios de bom senso no futebol e que nem todos estão dispostos a serem feitos de otário. A nota do Palmeiras é muito feliz e esclarecedora em alguns pontos, diz entre outras coisas que a contra-proposta feita por Assis já tinha sido aceita pelo Palmeiras, que a negociação transcorreu bem, porém "Qual não foi nossa surpresa ao ver pela imprensa que as negociações com outros clubes continuavam, apesar da palavra empenhada do senhor Roberto de Assis de que o jogador vestiria nossa camisa;
Por tudo isso, o Palmeiras faz questão de vir a público para enfatizar que jamais vai compactuar com esse tipo de comportamento." apesar de "Todas as cláusulas e valores pedidos pelo representante do atleta, neste período, foram 100% aceitas pelo Palmeiras e repassadas para a conclusão do negócio. As condições eram excepcionais, provavelmente as maiores do mercado brasileiro em todos os tempos. O empresário Assis afirmou ao Palmeiras que a transação estava fechada no dia 2 de janeiro. Desde então, foram várias respostas evasivas e tentativas frustradas de contato". O nome disso é má indole e falta de caráter. Enquanto Assis agia de maneira vil e anti-ética, chegando ao ponto de declarar que "Infelizmente existe o Milan na negociação", o Milan que paga os salários do seu atleta, confiou nele para vestir sua camisa e representar sua história, Ronaldinho Gaúcho, que supostamente é o interessado principal no assunto, estava indo a shows, tocando pagode e tirando fotos com diversas mulheres, sem dar ao menos uma declaração. Parece não se importar muito com o fato. Outra manifestação de seu profundo desinteresse quanto a carreira profissional é sua escolha, ou a escolha que deveria ser sua, quanto ao clube que defenderá. Não estou menosprezando a grandeza do Flamengo, todavia é inegável que disputar uma libertadores pelo time que o relevou, time o qual ele saiu brigado deixando apenas uma multa irrisória e amarga lembrança, deveria ser mais atraente para qualquer um. Afinal é a competição mais importante do continente na cidade em que ele nasceu. Contrariando as obviedades, Ronadinho vai jogar no Flamengo. Agora, saindo da parte logística da contratação, cabe refletir sobre o que acontecerá no gramado, o que é o mais importante (ao menos deveria ser).
Ronaldinho fará 31 anos em Março e vem em vertiginosa decadência há quase cinco anos. O curisoso é que nessa fase o jogador costuma viver o seu auge físico e técnico. Quanto ao físico do Ronaldinho, nem é preciso tecer muitos comentários. Não é sombra do que já foi, é frequentemente visto em festas tocando pandeiro e cavaquinho do que treinando pelas manhãs. Seu pulso anda mais exercitado que suas pernas. É inegável que sua qualidade técnica é muito acima da média, ele tem uma habilidade excepcional e foi um dos grandes jogadores do mundo em duas temporadas pelo Barcelona. O potencial é imenso, o profissionalismo e a vontade de explora-lo é escassa. Ronaldinho é rico, tem uma vasta legião de admiradores e a manifesta intenção de mídia de engradece-lo. A motivação parece inexistente desde os tempos de Barcelona. Graças ao nível técnico precário em terras brasileiras, não é difícil supor que Ronaldinho Gaúcho irá sobressair em diversos momentos. Não se deve esquecer no entanto que jogar sem se aguentar nas próprias pernas é capaz de afundar até o mais genial dos craques e esse é um desafio que o Flamengo terá que enfrentar. Com o Adriano o clube se mostrou incapaz de segurar suas estrelas, agora é a vez do Gaúcho.
No mais, a negociação em si comprova a tendência do futebol brasileiro nos últimos anos. Repatriar jogadores que já não despertam o mínimo interesse europeu e trata-los com craques indiscutíveis e grandes aquisições. Uma coisa é trazer o Romário melhor do mundo no auge em 95, outra coisa é trazer Ronaldinho Gaúcho gordo e reserva do Milan, que viu com bons olhos a chance de se livrar desse problema.
Todos se empolgam muito, surfando essa onda na mídia que insiste em vender seu próprio peixe envolto numa aura celestial. Quando, na verdade, é mais um que destituído da coroa européia, vem buscar um trono majestoso no Brasil. Espero que Ronaldinho dê errado, pois o exemplo da fanfarronice e falta de comprometimento não pode ganhar um ar glamuroso de vencedor, pois dessa maneira corre-se o risco de fabricarmos novos Robinhos, Ronaldinhos e "Neymars". Muita habilidade nos pés, pouca coisa na cabeça e uma imensa perda de talento.