quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

O Grande Mestre

Enquanto um grupo de aproximadamente vinte fedelhos sozinhos numa sala de quinta série propagava pelos corredores urros de algazarra, gritos da anarquia mais absoluta, o caos reina numa sala sem professor. Guerras de giz, gargalhadas, batucadas inúteis e sem sentido na mesa, cadeira batendo e arrastando violentamente contra o chão... No meio desse cenário apocalíptico um estrondo se sobrepõe a soma de todos os outros barulhos. O estrondo de uma mão peluda abrindo a porta. Entra em sala uma figura de olhar profundo, barba por fazer, cabelos escassos e bagundaçados. Sua presença exala autoridade e de repente todo o caos cessa em um repouso pleno. Aquele vulto imponente diz com a expressão fechada: "Vocês são da quinta série não é? Vocês estão atrapalhando a minha aula. Ano que vem vocês serão meus e eu vou acabar com essa festa. Façam silêncio."
E assim começou uma jornada de sábios e inigualáveis ensinamentos.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Mamãe, eu faço comunicação

Eu poderia fazer igual a maioria dos jornalistas blogueiros. Eles escrevem em períodos curtos.

Frases esparsas e simplórias.

Passando a informação sem ter que esquentar muito a cabeça em como escrever.


Assim é fácil, qualquer um consegue.

É preciso quatro anos de faculdade pra fazer isso?

Fica especulando notícias e passa-las desta maneira?

Curioso.

Acerca da unificação dos títulos

A "unificação" dos títulos brasileiros cometida pela CBF hoje é uma procissão de erros. A começar pela denominação "unificação", quando o que na realidade ocorre mais se assemelha a uma transformação de determinados torneios em outro. É praticamente um processo mágico, uma transmutação alquímica de um título datado em algo atual, pegaram 10 contos de réis e falaram que é uma nota de dez reais. O que se convencionou chamar unificação é um erro histórico, lógico e moral. Não passa de uma politicagem de última categoria, parte do lodo podre que degrada e entoxica o futebol com pareceres imbecis que o deformam cada vez mais.
O primeiro evidente equívoco dessa resolução é pura e simplesmente histórico. Atribuir um conceito posterior a um fato do passado é um anacronismo. Um erro de cronologia que consiste em pensar e classificar uma época com valores que não pertecem a esta mesma época. Antes de 1971 não existia campeonato brasileiro. Não existia a idéia, o conceito, a concepção, nada de campeonato brasileiro. Então de que maneira se pode chamar qualquer competição ocorrida no mundo antes de 1971 de campeonato brasileiro? Se o Graham Bell inventou o telefone de 1876 como eu posso chamar qualquer coisa antes disso de telefone? Nessas horas a ignomínia levanta sua bandeira e brada: "Ah, mas é como se fosse! Tinham bons times brasileiros disputando um campeonato, então o campeonato era brasileiro". Em primeiro lugar, "como se fosse" não é. Quando o Jason enterra um machado no crânio de uma loira gata que instantaneamente jorra sangue sob uma feição carregada de dor em alguma cena de Sexta Feira 13, é como se fosse um assassinato, mas não é. Nas madrugadas de solidão na sua casa, quando você entra no hellxx e se masturba, é como se fosse um ato sexual, mas não é. Esses dois exemplos grosseiros ilustram de maneira didática a diferença entre "como se fosse" e o é. Esse argumento da competição reunindo os ditos melhores times brasileiros da época ser suficiente para atribuir o valor de campeão brasileiro ao ganhador desse título resulta na segunda incongruência no argumento da nossa querida CBF. É o que vamos ver a seguir.
Nossa querida Taça Brasil era uma Copa que reunia todas os campeões estaduais. Com a palavra, a wikipedia: "Participavam da Taça Brasil as equipes campeãs estaduais de todo o país, porém as equipes mais fortes disputavam apenas as fases finais." Isso lembra alguma coisa? Tem certeza? Sim, é claro! A famigerada "Copa dos Campeões"! Pra quem não lembra, vamos voltar alguns anos no passado: "A Copa dos Campeões foi uma competição oficial da CBF disputada pela primeira vez em 2000, com o objetivo de determinar o quarto representante do Brasil na Taça Libertadores da América, os outros eram o campeão da Copa do Brasil, o vencedor e o vice do Campeonato Brasileiro. Em 2000 e 2001, participaram da Copa os vencedores do Campeonato Carioca, Campeonato Paulista, Torneio Rio-São Paulo e Copa do Nordeste. Além destes, os finalistas da Copa Sul Minas e os do triangular realizado entre os vencedores da Norte, Centro-Oeste, e o vice da Nordeste. Em 2002, 16 times disputaram a competição, sendo estes os 6 primeiros colocados do Torneio Rio-São Paulo, os semifinalistas da Copa Sul Minas, os 3 melhores da Copa do Nordeste, além dos campeões da Copa Norte e da Centro-Oeste, além do campeão do ano anterior." Hum... Parecido não? Campeões estaduais disputando uma copa.. valendo vaga na libertadores.. Tem alguma diferença?
Olha só, acabei de dar um motivo muito mais forte pro Flamengo choramingar um título brasileiro que o de 1987. Queria dar meus parabéns ao Payssandu e Palmeiras, outros dois novos campeões brasileiros seguindo a linha brilhante de raciocínio da CBF. Mais uma vez os leigos, influenciados e/ou interessados na questão dizem: "Ah, mas naquela época só tinha essa competição e ela dava vaga pra libertadores! É importante!" Nos últimos três anos de taça brasil existia o Roberto Gomes Pedrosa também, e o resultado disse é termos dois campeões brasileiros em um ano. O Brasil é uma terra de campeões mesmo, todo mundo é campeão. E no Uruguai, por exemplo, existe a liguilla pré-libertadores, uma copinha que tem mais que os 4 jogos da Taça Brasil, reúne os melhores times do país em busca de uma vaga na Copa Libertadores. Tente dizer a algum uruguaio que o campeão da Liguilla é campeão nacional, alguns vão rir de você, outros mais compreensivos te explicar que você está falando besteira.
Vale ressaltar que eu não quero despretigiar esses títulos. O Vasco em 1948 ganhou o Sulamericano, competição que reunia os melhores times do continente, com direito a River Plate de Di Stefano. Essa competição inspirou a criação da Champions League, que a mocidade tanto gosta de babar ovo e, posteriormente, da Libertadores. O Vasco ganhou a libertadores? Sim, em 1998. Em 1948 ele ganhou o Sulamericano. É parecido? É. Mas naquela época não existia libertadores. É importante? Muito. Vamos chamar ele de libertadores então? Não. O Sulamericano, o Robertão, a Taça Brasil tem que ser valorizadas pelo que foram, não categorizadas como algo posterior dissociado de sua história para ganhar falsos ares de importância.
Só para terminar, é duro ouvir esses jornalistas imbecis, problemáticos e políticos vomitando: "Mas o Pelé nunca foi campeão brasileiro então! Isso é absurdo!" Paciência, coisas da vida. Não adianta querer encobrir a incompetência brasileira em organizar um campeonato nacional decente considerando alguns torneios como se fossem verdadeiras copas nacionais. As dimensões continentais, a falta de infra-estrutura e a inerente relapsidade e incompetência organizacional só permitiram termos campeonatos nacionais a partir de 1971. Eu adoraria que já tivessem em 1950 pro Vasco ganhar tudo com o expresso, mas não existia. Querer reparar os erros do passado com novos erros só multiplicam as distorções, é mais sensato se preocupar com o futuro do futebol com clubes falidos, jogadores podres e decadência flagrante do futebol brasileiro. Nosso passado foi bonito mas já acabou. É melhor construir um futuro sem desacertos para serem vergonhosamente maquiados. Abolir os pontos corridos seria um bom começo...

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

28

Já sei que não adianta mais te procurar
Não importam o que me digam sobre onde você está
Se no céu, no chão ou qualquer outro lugar
Sei que é impossível poder te alcançar
E tampouco tê-la comigo de novo
Talvez você ainda possa me ouvir
Mas com isso eu não me iludo e nem comovo
É tão doloroso ver você partir
E não saber direito o que restou
Além das lágrimas nos meus olhos
E aquele disco que você deixou
Onde a melodia numa noite fria
Preenche as feridas no meu coração
Eu lembro de um tempo em que parecia
Que na porta ao lado você sempre estaria
Pra me receber com um sorriso e animação
Me contando velhas histórias de como eu era antigamente
Agora só tenho a certeza
De que nada será igual daqui pra frente
Lembranças de você passam na minha mente
Penso que agora sempre há de ser assim
Já que os momentos felizes que passei contigo
Nenhuma morte vai tirar de mim
Por mais que o tempo passe e a vida continue
Sem você sempre faltará algo
E não há eternidade que anule
Essa saudade que carrego comigo
Porque eu sou feito de você
Seja lá qual for o sentido


1 mês.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Encontro com Hades

Fazia uma manhã de sol. Eu poderia dizer que era uma bela manhã de sol, mas isso é relativo. Em Bollen, um grande jardim que emoldura um grande lago cristalino é sem dúvidas uma linda manhã. Os raios de sol espelhados na transparente água do lado irradia beleza por todos os lados. É lá que Leskius sai para correr e malhar. Um dos seus maiores orgulhos é seu corpo delineado e uma de duas maiores satisfações é sair com o dorso nu pelas ruas. Ele deixa sua imponente casa branca e vai correr se direção e carregar pesos inúteis sem tira-los do lugar.
Já trinta quilômetros à frente, a manhã não é tão bela. Em Ripeferia, o sol quente parece carregar o cheiro podre de esgoto junto a sua luz. O raios solares invadem as frestas dos precários casebres e acorda a todos as amontoadas e sujas famílias que ali habitam. Pócrates se levanta todo torto e enquanto se arruma em uma postura aceitável olha pela janela as ruelas imundas iluminadas irregularmente pela aurora da manhã. Ele já se acostumou com toda aquela miséria, o odo pútrido de merda não lhe dá mais dor de cabeça. Certamente dentro de algum tempo, nem lhe incomodará mais, como já passa despercebido pelos mais velhos. Nada é ruim o bastante para o ser humano não se acostumar. Não há mais tempo de olhar nem céu nem chão, é hora de se arrumar para o trabalho. O seu jegue cinza subnutrido, que recebeu o garboso nome de Herculanus em homenagem a um famoso orador que divertia grandes platéias em shows esporádicos, era incumbido da tarefa de carrega-lo pelo sinuoso e deplorável caminho até Bollen. Já montado em seu fiel companheiro, que compartilhava além das horas de viagem solitária um punhado de carrapatos, pôs-se a caminho pela velha estrada de terra.
Quando não tinha que desviar de algum obstáculo ou resolver qualquer problema que eventualmente aparecesse pelo caminho, Pócrates conversava com Herculanus, o jegue. Ele não sabia o porque, mas sentia-se extremamente a vontade ao conversar com o Herculanus, embora este raramente lhe respondesse e, quando respondia, era um relinchar que nada dizia.
Ao chegar em Bollen, ele sentia-se bem. Queria viver ali, sentir o aroma suave e puro das flores, o vento fresco que vinha do lago.. "Ah, imagine só que maravilhoso seria se..." Seu pensamento lúdico é atravasso por um grito que vem se aproximando "Ah, Pócrates, ainda bem que você existe.." Era Leskius voltando de seus exercício matinal, que continuava "...bom, meus pais ainda estão em viagem e eu chamei uns amigos para vir aqui ontem. Tem um pouco de vômito e lixo espalhados pela casa, você pode resolver isso pra mim, não é?" "Sim senhor".
Leskius orgulhava-se de oferecer banquetes enormes em sua casa. Era sua grande alegria. Ele acreditava piamente que sua vida era a melhor que se podia ter. Era um misto de festas, exercícios, ostentação, festas e ócio. Seu pai era um bem sucedido comerciante, logo, seu único filho recebeu tudo sempre no colo. Ele agora preparava-se para, um dia, substituir o pai. Já estava aprendendo a lidar com os empregados e estudava com um tutor que seu pai contratou a peso de ouro. Na verdade não estudava, ele dava galões de vinho e outras benesses ao tutor em troca de boas notas e mais tempo livre. Era admirado por todos, bonito, rico e com todas as luxúrias, facilidades e materialidades que a vida pode oferecer a alguém.
Enquanto Pócrates limpava os restos deixados pelos vorazes festeiros de ontem, Leskius foi passear pelo jardim pois não queria rever a casa enquanto bagunçada. Decidiu só voltar quando tudo estivesse brilhando, para aí sim decidir qual será a melhor maneira de interromper seu ócio. No momento em que ele passava uma macia toalha amarela pela cabeça, secando seus médios cabelos claros, surge uma figura sinistra ao lado da macieira. Ao abrir os olhos e deparar-se com um indivíduo extremamente macabro, cuja larga vestimenta preta cobre quase todo corpo deixando apenas o rosto e as mãos brancas feito neve, contrastando com um olhar estranhamente avermelhado. Leskius treme de susto e pergunta quem era e daonde saiu o bizarro invasor. Com um leve sorriso, a sinistra figura diz: "eu vim dali" e aponta pra baixo. Confuso leskius responde: "Do chão? você é louco? O que está fazendo aqui?"
"A principio vim apenas ter uma conversa, estou entendiado."
"Não quero conversar com você, vá embora."
Outro singelo sorriso, desta vez carregado de sarcasmo: "Não me lembro de ter lhe dado alguma alternativa."
Assustado com a mórbida calma e naturalidade daquela figura, Leskius cede: "Então o que quer comigo?"
Se aproximando lentamente enquanto passa os dedos no queixo, a estranha figura se apresenta: "Meu nome é Hades, como você já deve ter o conhecimento, eu sou o Deus da Morte. Estou aqui porque quero compreender algo que você da minha alçada. Quero entender sobre a vida. A grande maioria que eu recebo nos reino dos mortos pouco ou nada traz da vida, então pra que tê-la se não lhe serve de nada pelo resto da eternidade? Soube que você é admirado e até mesmo invejado por muitos, pois é cheio de vida. O modelo do melhor que a vida pode oferecer aos homens. Procede?"
Com uma vaidade imodesta, Leskius confirma: "Pode ter certeza. Eu tenho a melhor vida que um homem pode ter."
Feliz com a confirmação, Hades questiona: "Pois bem, rapaz. O que faz da tua vida tão excepcional?"
Leskius com um enorme sorriso e uma pose altiva inumera as alegrias de sua vida: "Eu moro no mais belo dos lugares, tenho cavalos, dinheiro mulheres. Sempre me divirto com meus amigos e..."
Hades intercede: "Não perguntei o que você tem ou faz. Perguntei sobre a sua vida. Seus cavalos e seu dinheiro são suas posses, não são você. Isso pouco me importa."
Leskius assume uma postura questionadora e diz: "Mas o que seria da vida dos homens sem suas posses? Um homem necessita dela para uma vida feliz."
"Você crê que o dinheiro e as benesses materiais surgiram antes ou junto com os homens? Você não pode usar como base de sua essência algo posterior a ela. Isso são meras frivolidades. Pergunto o que você é, porque e para que vives?"
Leskius atordoado responde: "Eu vivo para aproveitar a vida. O que se leva da vida é a vida que leva."
"E o que você vai 'levar da vida que você leva'" diz Hades com ar de deboche para depois completar: "Você vai levar vômitos, iniquidade, exploração e ignorância. Cavalos, dinheiro e perfumes não entram no meu reino. No Reino da morte não há espaço para utensílios e inutensílios."
Leskius tenta se defender: "Eu levarei amizades sinceras, o amor de meus pais, as alegrias que vivi"
"Você ainda não consegue ver que o que você denomina alegria não passa de uma morfina, um tampão que vocês usam para esquecer todos os problemas que a vida te dá. A vida te dá doença, a saudade, a exploração, o sofrimento. A morte acaba com tudo isso pra você. Mas o que te sobra, além do grande vazio que você não pode mais preencher com bebedeiras e consumos? Com o que você vai preencher seu vazio sem o dinheiro por perto? Sem suas falsas amizades e seu pretenso requinte? Como você vai se sentir especial e superior sem ninguém pra você subjugar? Vocês homens são todos iguais. Não sabem o que fazem, o que pensam e o que são, mas julgam ter a certeza de tudo isso e até mais."
"Agora só falta você dizer que eu sou como os escravos do meu pai. Que temos a mesma vida infeliz e miserável, temos o mesmo vazio interior. Eu gargalho todo dia, eu tenho tudo que eles almejam. Não temos a mesma vida. Isso você não pode dizer" Diz Leskius com a impressão de estar irremediavelmente certo pela primeira vez desde que encontrar Hades, que lhe responde de imediato:
"Vocês são igualmente patéticos. A diferença é que você encobre sua patetice com uma bela seda perfumada enquanto a deles são expostas e ridicularizadas em sonhos impossíveis de amenizar sua depressão com o dinheiro que os oprime. Ambos nasceram nus, carecas e banguelas e sem nada na cabeça. A diferença que vocês homens constroem em vida, eu destruo na morte. Por isso para mim vocês são idênticos. Você entenderá quando perder o efeito da sua ilusão, quando seu remedinho anti-monotonia acabar."
Leskius senta incrédulo sentindo seu mundo desmoronar. Ele imagina como alguém (ou alguma coisa) pode surgir assim do nada em seu jardim e destruir sua maravilhosa fábula. Antes que ele pudesse externar seu lamento, Hades virando as costas enquanto vai sumindo lentamente para baixo da terra diz: "Você não me ajudou em nada. Continuo sem saber porque vocês prezam tanto a vida que só lhes dá desgraça e um vazio infinito que só pode ser amenizado por ilusões passageiras e parvoíces simplórias. Você não passa de mais filisteu inútil. Lamento por você e pelos idiotas que o admiram. A gente certamente se encontrará no futuro, e você entenderá do que eu estou falando." E sumiu por completo nas entranhas do jardim.
Essa indesejável visita surtiu um efeito de pouco mais de oito minutos na mente de Leskius, que decidiu que era bem mais sedutor esquecer essa passagem e voltar para seu mergulho no lago, suas bebedeiras e extravagâncias. Afinal, assim é muito melhor. Pra que questionar?